Uma das coisas que na China se diz quando falamos de guerra ou conflito tem a ver precisamente com esta questão.
“Salvaguardar a face do inimigo”.
Numa negociação, por vezes, uma das partes toma posições extremas que normalmente não levam a lado nenhum.
Existe um conjunto de técnicas de negociação baseadas em pressão que podem levar a que a negociação caia por terra, dependendo do perfil e posição de poder negocial que a outra pessoa tem.
Um desses exemplos é o “abandonar a negociação”.
Como é que isto é feito?
Pode tomar várias formas numa negociação.
Desde o mais alegórico possível, em que os clientes saem porta fora dizendo que assim não é possível negociar.
Ao mais suave, dizendo que não têm possibilidade de avançar com a negociação com estes valores e que vão ter de interromper o processo ali.
Pode inclusive existir uma forma mais subtil de abandono que é o abandonar aparente da negociação.
Vou contar-vos duas histórias que se passaram comigo há já bastante tempo, mas que ilustram precisamente cada um destes dois casos.
O primeiro passou-se com a empresa “X”.
Estávamos em Agosto, mês de pouco movimento.
Na altura, eu era Director Geral de uma empresa na área de tecnologia que implementava sistemas de gestão.
Dado ser o mês de férias da Directora Comercial e os outros três comerciais terem propostas também para apresentar nesse dia, tomei eu a liderança do processo e fui apresentar a proposta.
Em termos de equipas técnicas, existiam duas.
No momento, uma delas encontrava-se parada, sem trabalho, dado ter terminado com sucesso um projecto na semana anterior.
Assim sendo, e se este projecto fechasse, seria óptimo para podermos pôr aquela malta a trabalhar e não termos prejuízo nos rácios de horas trabalhadas nesse mês.
Dirigi-me à empresa, a reunião começava às 9:30.
Cheguei pontualmente, como de costume, normalmente 5 a 10 minutos antes, fechei os olhos no carro e revi mentalmente o meu plano de actuação em termos da negociação que ia começar.
Revi os pontos de poder existentes, o que é que eu tinha para dar além do desconto e foquei-me mentalmente nos resultados que poderiam dali sair.
Confiante de que estava preparado para avançar, saí do carro e entrei na empresa.
À minha espera estavam duas pessoas do lado deles – o Director Geral e um Director de Produção.
Sentámo-nos, abri o portátil e, depois dos cumprimentos e quebra gelos iniciais, comecei a apresentar a proposta do Sistema de Gestão deles, em detalhe.
Módulos, características, benefícios, onde é que iriam poupar dinheiro.
Como é que o sistema lhes permitiria reorganizar o seu trabalho interno a nível de obra e a nível financeiro, etc.
Esta parte demorou cerca de 1 hora, devido ao tamanho do sistema.
A partir daí avançámos para o capítulo do “Investimento”.
Apresentei as condições, valores, módulos, formação e tudo o resto que compunha a estrutura de preços.
Enquanto estávamos a ver a apresentação do sistema, o ambiente era calmo; a partir do momento em que começámos a entrar na parte financeira, começaram a surgir os problemas.
Um deles era a favor, o outro era contra, dado o valor da proposta.
Um deles tentava deitar água na fervura, o outro tentava sempre complicar.
Ou seja, a típica estratégia de “Bom Polícia” vs “Mau Polícia”.
Se quer saber o que é isto, tem duas hipóteses: ver alguns episódios do CSI ou então participar no Congresso Nacional de Desempenho e Motivação Comercial, no dia 16 de Abril, e estar com muita atenção à secção sobre Negociação.
Mas voltando à nossa história.
Como de costume, ignorei este jogo e continuei com a negociação como se nada fosse.
Ao ver que isto não me afectava, o “Mau Polícia” saiu da sala de rompante, sem ai nem ui.
Ou seja, utilizou o “Abandonar” como técnica negocial.
O “Bom Polícia”, na sequência do que o outro fez, veio com uma história de que queriam mesmo avançar, mas que precisava do aval do outro.
Se eu não podia baixar os valores em 15%.
Eu ia preparado para negociar, tinha todas as componentes bem presentes na minha cabeça e disse-lhe:
“Eu gostaria de ir ao encontro das Vossas necessidades.
Deste modo, dado que os nossos investidores espanhóis não permitem esse valor de descontos, o que posso fazer é ir até aos 5% e oferecer a formação das pessoas na utilização do sistema.”
Ora aqui utilizei uma figura de autoridade superior em termos de negociação e fiz um trade off de um valor monetário por um valor que para eles também era monetário, mas que para mim era um custo fixo – as horas da equipa de formação.
Não contente com isto, a outra parte virou-se para mim e disse-me:
“Agradeço o seu empenho, mas com estes valores penso que não vamos conseguir ir adiante com o projecto.”
Guardei o portátil, apertámos as mãos, eu levantei-me, dirigi-me à porta, saí e ele ficou ainda dentro.
De repente desata a rir e diz:
“Vá lá, sente-se lá e vamos lá assinar isto, estava só a ver se não tinha mesmo mais nada para dar.”
Ou seja, tinha estado a utilizar uma táctica de bluff.
Como vê, ganhar ou perder um negócio passa por muito mais do que somente apresentar produtos ou serviços e fazer ou não fazer descontos.
Bem jogada, uma negociação é um autêntico jogo de xadrez.
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