No meu trabalho directo com as empresas tenho observado nos últimos anos um fenómeno no campo da motivação 2.0.
Trata-se de uma situação um pouco estranha e à partida não lógica.
Quando se tenta motivar alguém com um: “Olha que se conseguires fazer mais isto… ganhas mais isto!”, por vezes estamos à espera de uma reacção positiva e o que obtemos é apenas um grande silêncio, como se aquilo não fizesse sentido nenhum para a pessoa em causa.
Ou, por exemplo: “Olha que isto está mau, se não conseguires atingir…”
E qual é a resposta da pessoa? Exactamente a mesma, ou seja, nada!
Quer isto dizer que começamos a perceber que por vezes a motivação 2.0, dor e prazer, não funciona com todas as pessoas.
Por exemplo, no meu caso em particular, no que diz respeito a trabalho, não corro por causa de dinheiro, nem de fama, mas sim pelo gozo que isso me dá e porque é uma ferramenta que tenho para atingir uma meta de vida um pouco ambiciosa no campo da responsabilidade social, como iremos ver mais adiante.
O que vos quero contar é baseado no trabalho de um senhor chamado Daniel Pink e no seu livro “Drive”, que já está editado em Portugal há algum tempo.
Segundo Daniel Pink, existem estudos realizados por psicólogos nesta área que remontam já há alguns anos e que indicam que a motivação 2.0 sofre de vários problemas que podem levar a consequências bastante complicadas em termos da performance.
O que temos de pensar em termos de motivação é que ela tem normalmente duas formas:
1. Interna
Tem origem dentro da pessoa. As razões para correr são geradas internamente, sem o auxílio de nenhuma intervenção externa ou, pelo menos, com pouca.
2. Externa
A motivação é conseguida através de situações externas, sejam elas monetárias ou físicas em termos de prémio, ou então psicológicas. Por exemplo, um líder pode utilizar o afastamento emocional de uma das pessoas da sua equipa como forma de castigo.
Nos estudos que foram realizados chegou-se a uma série de conclusões sobre o que é que fazia a diferença em relação ao uso da Motivação 2.0 ou 3.0. A primeira delas tem a ver com o tipo de tarefa a realizar.
Nos estudos que foram feitos, gerou-se um conjunto de experiências por forma a analisar a eficácia de cada tipo de motivação.
Os resultados foram no mínimo surpreendentes. Chegou-se à conclusão de que um dos factores que poderia influenciar o processo seria se a tarefa era mecânica ou rotineira ou, por outro lado, diversificada e que permitisse um certo grau de autonomia e aprendizagem.
Ou seja, quando a tarefa era rotineira ou monótona, a motivação 2.0, dor versus prazer, funcionava bem.
Pagamos mais temos mais performance, pagamos menos temos menos. No entanto, sempre que a tarefa necessitava do uso de skills rudimentares simples ou de autonomia ou criatividade, o processo era inverso.
Podia pagar-se mais, mas nem sempre se tinha maior performance.
A experiência foi realizada em vários ambientes nos Estados Unidos, nomeadamente no MIT, onde se criou um conjunto de prémios em função do atingir determinados objectivos.
No caso, pensaram que o que estava a influenciar o processo era o valor das recompensas, que poderia ser muito baixo para estudantes do MIT, e então decidiram levar a experiência para Madurai na Índia, onde os prémios significavam muito mais para as pessoas. Existiam três escalões de recompensa que correspondiam em termos de valor monetário a 2 semanas de ordenado, um mês de ordenado e, no prémio mais elevado, dois meses de ordenado. Por incrível que pareça, os resultados foram os mesmos.
Então, o que é que motiva as pessoas no caso de tarefas que não sejam mecânicas ou rotineiras?
Chegou-se à conclusão de que nestas situações os factores que influenciavam o processo seriam três e que, como vamos ver, têm muito a ver com as necessidades humanas apresentadas mais atrás. Vamos então ver quais são.
AUTONOMIA
Todos nós temos necessidade de sentir que estamos no controlo das nossas vidas. Quando tal não acontece, na maior parte dos casos existe algum grau de desmotivação.
No campo das vendas, realizamos vários estudos em clientes nossos que neste momento têm as carreiras congeladas e um dos factores que lhes sugerimos para aumentar o nível de motivação dos comerciais prendeu-se precisamente com isto – o aumento do nível de autonomia no processo negocial, por exemplo, ou em algumas componentes do processo comercial.
Num dos casos notámos que os comerciais tinham obrigatoriamente de falar com o seu director quando queriam negociar condições especiais. A experiência que foi realizada passou por dar ao comercial uma maior margem de manobra em função do negócio em causa. Por exemplo, dizendo-lhe que quando o negócio estivesse dentro de determinado montante poderia ser ele a decidir qual a percentagem de desconto a apresentar ao cliente em função de uma margem pré-acordada.
Os resultados foram bastante surpreendentes e os níveis de motivação da equipa na maior parte dos casos aumentaram. Poderemos estar a pensar que isto é lógico e faz sentido, mas por incrível que pareça nem sempre as empresas pensam nisto.
MESTRIA
Mestria é o desejo de evoluirmos e sermos melhores.
Pense comigo. No passado, quando numa das empresas onde trabalhou, chegou àquele ponto em que já não conseguia evoluir ou aprender mais, como é que se sentiu?
Se for como eu, provavelmente desmotivado ao ponto de querer novos projectos e coisas novas para fazer. Mesmo no campo das vendas, isto acontece. Tenho vários clientes que utilizam como forma de motivarem os comerciais novos desafios, novos mercados, tipos de clientes diferentes, enfim, algo que implique que eles tenham novamente uma curva de aprendizagem.
Mas isto não acontece somente no local de trabalho. Pense, por exemplo, na sua vida pessoal. Por vezes começamos a aprender novas coisas, hobbies, desportos, apenas pelo prazer de sentir que estamos a evoluir.
Um amigo meu decidiu agora, aos quarenta anos, começar a aprender a tocar guitarra. Poderemos pensar: é lógico ele investir em aprender a tocar guitarra? Será que vai ganhar a vida a tocar guitarra? Claro que não, na maior parte dos casos, e especialmente no dele, não. Mas é pelo gozo que nos dá sentirmos que estamos a evoluir em algum âmbito.
Quando isso não acontece, muitas das vezes estagnamos como pessoas e como profissionais.
PROPÓSITO
O ser humano tem necessidade de sentir que está a contribuir para algo maior do que ele.
Por exemplo, quando o propósito da empresa onde trabalhamos é apenas o lucro, na maior parte dos casos as pessoas não se envolvem da maneira que poderiam envolver. Ou seja, necessitam de saber que o que fazem contribui para algo maior do que elas num sentido que nem sempre tem a ver com o lucro.
No caso da nossa empresa, a Ideias e Desafios, um dos nossos maiores objectivos é que num intervalo de cinco a dez anos, cinquenta por cento do nosso tempo facturado seja alocado a solidariedade social. Neste momento é já mais de 35%.
Fazemos desde diversos projectos de formação comercial e de liderança gratuita para desempregados a projectos de formação, coaching e consultoria gratuita com a maioria das IPSS em Portugal.
Se me perguntarem o que é que, nos dias de hoje, me faz correr e ganhar dinheiro como ganho, é precisamente o propósito de conseguir ter fundos para poder realizar todos estes projectos.
Mas este é o nosso caso, temos alguns dos nossos clientes que também já o estão a fazer. Por exemplo, uma das maiores empresas a nível nacional e internacional na sua área de actuação tem apostado cada vez mais nesta vertente, sobretudo desde que ficou com as carreiras congeladas internacionalmente. Ainda no outro dia, quando conversava com a sua directora de recursos humanos, ela dizia que se têm lembrado de nós precisamente por causa de todos os projectos de solidariedade que têm promovido e nos quais as suas pessoas se têm envolvido.
Esta semana pare um pouco para pensar: será que a cenoura e o chicote na minha empresa ainda funcionam?
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