Uma das coisas que recordo com saudade são os meus tempos de miúdo, especialmente os que aprendi a andar de patins. Naquele tempo ainda eram patins de quatro rodas.
Foram tardes muito bem passadas no ringue de patinagem do Jardim Zoológico com um professor já de idade que lá se encontrava aos fins de semana a ensinar miúdos e graúdos.
Uma das coisas que recordo especialmente é que as grandes quedas não se davam logo no início, em que todos andávamos devagar, cheios de medo de cair, normalmente agarrados ao corrimão, enquanto não se ganhava à vontade para patinar no meio do ringue.
Após esta fase inicial, vinham então aquilo que nos meus tempos de miúdo se designava por uns grandes “bate cus”. Ou então, se quisermos ser mais polidos, umas grandes quedas.
Estou a escrever hoje sobre este tema, porque de uma certa forma é similar a todos os processos de aprendizagem que realizamos quando entramos numa nova área de negócio.
No início vamos a medo, pensamos no que fazemos, nas condicionantes que isso implica, e só após se analisar bem as coisas é que de facto avançamos.
Passado algum tempo, consoante avançamos no processo de aprendizagem, tudo isto começa a ser integrado e o que no início eram passos que dávamos com cuidado estão no domínio do automático e já nem pensamos quando o fazemos.
Se pensarmos nos processos de liderança, e em como as pessoas os encaram, é precisamente isto que temos tendência a fazer.
No início, pensamos em tudo, no impacto nas pessoas, na melhor forma de o fazer, enfim, às vezes é certo que pensamos até demais, mas no que toca à liderança vale, de facto, a pena pensar um pouco.
Depois, quando deixamos de pensar, é que vêm as grandes “quedas”.
Chamo a isto a síndroma do “sinal amarelo”.
Se tiver um sinal amarelo à frente, o que é que normalmente faz?
Abranda e para?
Vá lá, seja sincero, abranda mesmo?
Provavelmente, se for como a maioria das pessoas, acelera para ainda apanhar o sinal aberto.
Se no trânsito, por vezes, ainda nos escapamos — embora, na maior parte dos casos, acabemos por entravar o trânsito todo — na liderança o caso já pia mais fino.
Uma das coisas que aprendi há muito anos foi que a almofada é boa conselheira. Embora eu pessoalmente seja de decisão rápida, rodeei-me há muito tempo de pessoas que ocasionalmente me fazem abrandar e parar.
Naturalmente sou tentado a avançar e decidir.
Sou partidário de uma linha de pensamento que diz que mais vale uma má decisão do que nenhuma.
Geralmente isto até é verdade, mas muitas vezes na liderança dá asneira.
Ora, ir contra a nossa maneira natural de realizar as coisas nem sempre é fácil, por vezes somos demasiado obstinados para o fazer, mas podemos sempre ter à volta pessoas de confiança que nos façam abrandar e parar para pensar um pouco mais no assunto.
Costuma-se dizer que “o feedback é o pequeno-almoço dos campeões”, no caso dos líderes. Eu diria ser o pequeno-almoço, o almoço e também o jantar.
Uma liderança sem feedback é um desastre à espera de acontecer.
Por isso, e se voltarmos aos “patins”, e começarmos a analisar como hoje em dia “patinamos” na área da liderança, vamos com certeza encontrar situações que antes eram pensadas e hoje em dia não.
Quer exemplos disso?
Coloque a si próprio estas questões e responda por favor a elas da forma mais honesta possível!
No seu relacionamento com as pessoas que lidera:
- Será que ainda se adapta a cada pessoa que lidera como fazia no início ou hoje em dia já as toma como adquiridas?
Nas decisões de liderança que toma:
- Será que analisa todos os dados disponíveis?
- Será que analisa o problema ou situação de todos os ângulos possíveis, mesmo os que não são seus?
Na resolução de conflitos na equipa:
- Será que ainda procura ser isento na análise das partes?
- Será que face à convivência de anos com as pessoas que lidera, as preferências ou simpatias naturais por alguns não influenciam a sua decisão?
Na forma de liderar as diferentes pessoas da equipa:
- Será que entra em linha de conta com a maturidade emocional (motivação) e a maturidade profissional (saber fazer) na forma como lidera cada pessoa da equipa?
Coloque a si próprio estas questões, reflita e pare um pouco para pensar:
“Será que a minha empresa e eu já tomámos o patinar como algo adquirido?”
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