Já houve tempos em que na minha vida o receber era… conotado com dor.
Será talvez estranho, mas à falta de melhor termo, dor serve perfeitamente.
Muito se fala hoje em dia de dar.
Dar sem interesse, dar por razões altruístas, dar por solidariedade e tantos outros “dares”.
Mas será que o “dar” existe sem o receber?
Foi uma questão que me ocupou a mente há alguns dias num dos processos de coaching executivo em que tenho estado a trabalhar.
Se perguntarmos à maior parte das pessoas à nossa volta qual das situações é mais fácil, dar ou receber, provavelmente dirão “dar”.
Poder-se-ia pensar que seria o “receber”, dado a sociedade egoísta em que vivemos. Pelo menos é o que muitos dizem, eu sinceramente vejo as coisas de outra forma.
Ora, se não é, porque é que acham que isto acontece?
Poderá estar a pensar:
“Hummm, não é bem assim, eu adoro receber…”
Adora mesmo?
Recorde a última vez que elogiaram algo relacionado com o seu trabalho, em que lhe fizeram um elogio sincero e merecido.
Qual foi a sua reação?
Foi dizer obrigado, ou surgiu algum desconforto e as primeiras palavras a sair foram “Aaaá, não é bem assim, nem foi assim tão bom” ou algo parecido?
Porquê esta reação?
Se o trabalho foi bem-feito, se o elogio era sincero, porque não olhar nos olhos da outra pessoa e dizer pura e simplesmente:
“OBRIGADO!”?
Na experiência que tenho, muito disto deve-se a uma questão principal.
- Acharmos que não merecemos…
- Acharmos que não somos bons o suficiente…
- Que os outros são melhores…
- Que foi apenas sorte…
Será preciso continuar?
Em termos de performance, a que é que isto pode levar?
Por um lado, inconscientemente, damos uma indicação clara que ter sucesso… nos traz “dor”.
Que ter sucesso ou fazer algo bem-feito não nos traz felicidade, mas sim desconforto.
Ora, o nosso inconsciente é muito bom a aceitar ordens, pelo menos aquelas dadas por nós e ditas com certeza e congruência, e a executá-las.
Assim sendo, se lhe indicamos que ter sucesso, fazer bem ou muito bem, nos traz desconforto, provavelmente irá fazer tudo o que esteja ao seu alcance para que não o voltemos a ter.
É uma razão muito subtil, mas posso dizer-vos que é daqueles travões à performance que leva a que muitas pessoas, nas empresas e nas suas vidas, não cheguem a atingir todo o potencial que têm, e que muitas vezes é elevado.
A razão…
“Não o mereço”.
Agora, se não estiver disposto a receber da vida, do mundo, das pessoas à sua volta, como é que acha que está a sua capacidade para dar?
Será que é proporcional?
Se não é proporcional, o que acha que lhe acontecerá?
Quando cheguei aos 40 anos, aproximadamente, o mundo à minha volta deixou de fazer sentido.
Foi como se olhasse para a frente e nada do que tinha planeado fazia agora sentido.
Depois de muitas explorações, reestruturei as minhas prioridades e voltei-me para o dar.
Explorei várias formas, até que comecei a criar os meus próprios projetos de “dar”, ações de solidariedade, projetos com as instituições que ajudam outros, enfim, uma multiplicidade de projetos que ocupavam quase 20 a 30 por cento do meu tempo “faturável”.
Poderá perguntar: qual foi o maior ganho que tirei disto tudo?
- Emoção?
- Sentir-me bem comigo?
- Recompensa emocional?
- Sentido de missão?
Tudo isto, de facto, está hoje presente na minha vida, mas se me perguntarem qual o maior ganho que tive…
A capacidade acrescida de “Receber”.
Receber da vida, do mundo, das pessoas, de tudo à minha volta.
Foi como se ao esticar a minha zona de “dar”, quase sem me aperceber, a minha zona de “receber” crescesse na mesma proporção.
Esta semana pare um pouco para pensar:
“Será que na minha vida estou a evitar “receber” o que mereço?”
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